domingo, 19 de agosto de 2012


CONFISSÃO

Márcio Simeone
Cadeira n.º 8

Se andei pelo mundo assim, desacorçoado, é porque cometi grave falta. Submeti-me à intensa e constante clareza, sem me dar conta de que tanta luz me paralisava e cegava. Todas as luzes estavam sempre acesas e já não me permitiam sequer o repouso. Fui apagando uma a uma para deixar, no fim, apenas uma pequena lanterna, suficiente para não mergulhar na mais profunda escuridão. Para mim esse lume tímido transformou-se, logo, na mais bela das descobertas. Tudo em volta se encheu de sombras, desenhando em minha mente os mais belos sonhos. Daí por diante meus olhos foram se acostumando e achei, com assombro, a beleza dos meio-tons, os prazeres dos devaneios, para ver, a média luz, os interstícios, os entremeios, antes desconhecidos. Encontrei na aurora meu momento e meu sentido: nem tudo, nem nada. Ali, simplesmente, onde o dia busca ser e a noite ainda é, na plácida harmonia dos eternos devires, o que ainda sou se mistura, sem conflitos, com o que arrisco ser. Se assim amanheço, caminho seguro pelo dia luminoso, certo de encontrar, em mais ou menos meia jornada, o conforto do lusco-fusco. Nem fim, nem começo. O brilho mínimo e pálido da lanterna estará ali até que sobrevenha o cansaço, meus olhos mergulhem dentro de mim e eu seja.

Um comentário:

  1. Não consigo nem comentar, Márcio. Estou aqui sentindo e vendo as suas palavras... Que beleza!

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