Márcio
Simeone
Cadeira
n.º 8
Só quero agora que este beijo dure pelo menos dez minutos.
Sei que você vai dizer que nunca nos beijamos por tanto tempo, mas eu sou capaz
de nos lembrar daquela noite, lá na ponte... Foi isso, ou mais? Para mim pode
ter sido vinte, vinte e dois. Se eu marquei no relógio? Não, mera percepção.
Quero ter a sensação de pelo menos dez, aquela de quase não se acabar. Com
efeito, o daquela noite foi o mais longo. Para mim começou como uma festa, nós
e todos dançando, músicas, palmas, gritos, uma algazarra feliz, para lentamente
ir-se transformando em algo mais suave, a ponto de não ouvir mais nada,
desligar-me e cair no profundo abismo silencioso. Bem diferente daquele
primeiro (lembra-se?). Ali eu ouvia uma música suave, um coro de vozes
infantis. Poucos segundos, passados trêmulos e completamente inundados da
promessa do paraíso. Só um primeiro sinal. Na vez seguinte, tínhamos medo e o
peso da responsabilidade. Ao toque dos nossos lábios, não vi nem ouvi nada e
logo me dei conta de abrir os olhos, para ver se era verdade: você, diante de
mim, a me capturar, era quase inacreditável! Mas era verdade. Logo mais, já não
importava. O som era de pássaros. Desfez-se a fronteira entre a realidade e a
ilusão. Guardo na minha memória como se tivesse sido um sonho bom, o melhor de
todos. Você veio então com mais pressa e senti-me como um relógio que atrasa,
um trem que não chega à hora prevista e demora em partir daquela estação, com
os passageiros aflitos, sei lá. Tudo era bom, ainda assim. Pois entenda:
naquela noite, a da ponte, deu-se a perfeita sincronia. Tínhamos o tempo todo
do mundo à disposição. Tanto que não acabou. Acho que agora já se passaram dois
minutos e o silêncio deste beijo é como mergulhar no oceano. Quero que dure
dez, vinte minutos, trinta anos. Que reúna todos num só, longo, terno e suave
encanto, sempre renovado encontro.
O que é o tempo? E a duração do Tempo? Tudo é percepção... "lamber" um picolé, quando era menino, era uma eternidade... Sonhos dos sonhos... e ia devagar para durar ainda mais... As coisa são assim, não é?
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