Carmélia Cândida
Cadeira n.º 2
Gabriel tanto pediu, tanto
insistiu, que a mãe fez uma árvore de Natal. Em lotes vagos da vizinhança do
bairro pobre e pouco povoado, juntou galhos secos. Envolveu-os com o algodão, ajeitou
os galhos em uma lata com areia. Em vez de bolas coloridas, pendurou no tronco
fotografias, desenhos das crianças, estrelas e corações feitos de papel, além
de “presentes” com caixas de fósforo vazias. A mãe ainda pegou uma imagem do
Menino Jesus, herança da avó, e colocou-a ao lado da árvore.
As crianças – Gabriel e o irmão
menor, Rafael – acompanhavam tudo com os
olhos brilhantes de emoção, ajudando como podiam. Quando a árvore ficou pronta,
não cabiam em si de tanto contentamento por ter ali, em casa, uma árvore de
Natal com a imagem do Menino Jesus ao lado. Estava tudo lindo! Os dois meninos
começaram a pular e a dançar olhando
para a árvore, enquanto a mãe cantarolava uma canção natalina. A avó assistia a
tudo, feliz por ver a alegria dos netos.
Gabriel já tinha perguntado para
a mãe, mais de uma vez, se naquele ano haveria presentes no Natal. Ela dissera
que não, explicando com carinho e pedindo que ele compreendesse. As coisas
estavam difíceis. Era uma mãe solo, o pai tinha ido embora pouco depois de
Rafael ter nascido e não voltara para dar notícias. O dinheiro mal dava para
pagar as despesas, os remédios da avó dos meninos, que morava com eles.
A mãe também ensinara que o
sentido do Natal não é ganhar presentes, que o Natal é a comemoração do
nascimento de Jesus. Gabriel havia entendido tudo e estava feliz porque prepararia
seu coração para receber o Menino. Mas ele também queria ganhar um presente, mesmo
que o sentido do Natal não fosse isso. Só tinha sete anos! E, mesmo a mãe tendo
avisado que não haveria presentes, ele pedia, do fundo do seu coração, que um
milagre acontecesse e que ele e o irmão pudessem ganhar um brinquedo.
Chegou a noite de Natal. A mãe fez
uma janta sem luxo, mas saborosa. A família rezou, agradeceu pelo ano que
estava terminando, pela alegria de estarem juntos, pelo nascimento de Jesus em
seus corações. Depois jantaram, e a avó contou histórias. Por fim, todos se
abraçaram e foram dormir. A mãe estava tão cansada que entrou em sono profundo
num instante; a avó, que tomava remédios para dormir, em minutos, estava
roncando. Mas Gabriel ficou acordado. Sem fazer barulho, se levantou, pegou os
pares de sapatos dele e o do irmão e colocou-os atrás da porta. Quem sabe...
quem sabe... Depois adormeceu, com o coração cheio de esperança.
Quando amanheceu, Gabriel foi o
primeiro a acordar. Levantou e foi correndo para onde tinha deixado os sapatos,
atrás da porta. Será que encontraria presentes? Mas, no lugar, só havia os
sapatos, do jeito que ele tinha deixado. Nada de presentes... Tentou a guardar
os sapatos antes que a mãe e a avó vissem que ele os tinha deixado à porta, mas
se deparou com as duas quando se dirigia ao quarto.
Ele ficou tão triste! Até quis,
mas não conseguiu disfarçar. Ficou amuado o dia todo. Quase não brincou. Comeu pouco
no almoço. Não quis nem tirar o pijama de flanela. A mãe, vendo-o desanimado,
sentia o peito apertado. Ela daria até a vida pelo filho, mas não teve
condições de lhe dar um presente de Natal... O que pôde fazer foi pegá-lo no
colo, fazer-lhe carinho e dizer-lhe palavras doces. A avó também tentou
animá-lo, contando histórias divertidas.
Foi então que Gabriel,
aconchegado à mãe, sentindo o calor dela, vendo o irmão no colo da avó, pensou:
“não vou ficar triste; presente maior é ter minha mãe comigo, meu irmão, minha
avó... isso é felicidade”. Então ele abraçou a mãe muito forte e lhe deu um
beijo. “Mamãe, a senhora, o Rafael e minha avó são meu maior presente!” Depois
beijou a avó e o irmão.
Já estavam no meio da tarde.
Gabriel tinha se animado a se levantar e a tomar banho. De repente, alguém
chama, na rua. “Ô, de casa! Quem será? Sobe no sofá, olha através do
basculante. Um homem e uma mulher, sorridentes e com uma sacola grande nas mãos.
Gabriel abre a porta e vai correndo para a rua. O casal pergunta:
- “Tem criança nessa casa?”
- Tem, sim, eu e meu irmãozinho.
- Quantos anos ele tem?
- Dois, quase três.
O casal abre a sacola, mexe,
revira, depois tira dois presentes e entrega para Gabriel. “Este é para você, e
este é para seu irmão.” O menino não sabe o que dizer. Seu coração acelera. Fica
imobilizado, olhando para os embrulhos. “Pegue. É para vocês.” Olha para a mãe,
que está com o irmão à porta e diz “sim” acenando com a cabeça. Ele pega os presentes e corre até a mãe e o irmão,
pulando e gritando “Eu sabia, mãe! Eu sabia que Papai Noel não nos esqueceria!”
Entrega o presente do irmão, entra
na casa e abre seu presente. É um brinquedo! O mais lindo que ele podia
imaginar. Gabriel volta à porta. O casal ainda está lá, sorrindo, conversando
com a mãe. Meio tímido, grita: “Obrigado, moço! Obrigado, moça! OBRIGADO!!!” Volta
para dentro e começa a brincar com seu brinquedo.
A mãe agradece o casal, que se
vai, e senta no degrau da porta para ajudar Rafael a abrir o que ganhou. O menino logo coloca o brinquedo no
chão, um carrinho, e começa a brincar. Ela sente os olhos marejarem. Pega um
pedaço de tijolo e vai escrevendo devagar, na terra: “Obrigada, meu Deus!
Obrigada, Papai Noel!”
Então, feliz, cantarola uma canção assim:
Natal, Natal das crianças
Natal da noite de luz
Natal da estrela-guia
Natal do Menino Jesus
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