sábado, 12 de setembro de 2020

Pipoca e as sementes mágicas

Conceição Cruz
Cadeira n.º 4




No final do século passado, numa próspera fazenda, na região centro-oeste do interior de Minas Gerais, próxima a São José da Varginha, nasceu uma menininha apelidada de Pipoca pela família. Ela era forte! Parecia uma bezerrinha mimada!

Já mocinha, laborava na roça, ajudava na colheita do milho. Gostava de animais, da roça, de cheiro de mato, de água fresca, enfim, de morar na fazenda. Quando ia à cidade, ficava preocupada ao ver como as pessoas estavam cada vez mais tristes, mais estressadas!

Um dia, ao percorrer os pastos, voltando para casa bem à noitinha, viu uma luz migrar de um ponto a outro: uma tocha de fogo!

Por aqueles arredores, corria um boato de que aquilo era a famosa Mãe do Ouro, mudando o precioso metal de lugar. Acreditavam, porém, que se alguém se deparasse diretamente com aquela força, desmaiaria e até morreria.

Para evitar que as pessoas daquele lugarejo desmaiassem ou morressem, pois ninguém sabia onde aquela luz apareceria de novo, resolveu procurar as autoridades na capital para relatar o ocorrido. Qual não foi a sua surpresa ao ver que as pessoas morriam de rir ao ouvir a sua história e, principalmente, de seu sotaque interiorano, de seu modo de falar. Diziam que aquilo parecia “causo” de pescadora.

Fantasia! Isto não existe!

 Ela andou, andou, andou. Cansou-se. Voltou para casa. Continuava pensativa ao ver tantas pessoas já sem brilho no olhar, onde a rotina parecia lhes consumir o dia, as horas, o tempo, a vida... Novamente, a Luz apareceu dentre as pastagens.  Pipoca fixou bem aquele ponto.

No outro dia, bem cedinho, foi àquele local.

Curiosamente, encontrou várias árvores frondosas, de floração amarela: pareciam cobertas de ouro! Maravilhou-se com a beleza do colorido das flores. Respirou profundamente! Sentiu a magia da natureza, da mansa brisa, do perfume delicioso e delicado que pairava no ar...

Observou que as flores lembravam sorvetes, bonecas e até mesmo caras de palhacinhas com chapéus. Ficou ainda mais feliz! Percorreu o campo. Colheu um pouco de tudo. Em casa, colocou o milho na panela. As pipocas pululavam juntamente com suas ideias...

As pessoas riem dos fatos que ocorrem por aqui!

À noite, enquanto dormia, sonhou com a tocha de fogo flutuando sobre a sua cama e lhe dizia:

– Não tenha medo! Que tal você ser “A Pipoca”?

 Acordou cedo. 

Viu que a sua casa estava coberta de flores amarelas: todo o telhado, em volta da casa, o quintal todinho! Tudinho! Ficou intrigadíssima!

Parece que a tocha trouxe com ela um vendaval perfumado. Está tudo “coalhado” de lindas flores também na realidade!

Passou vários dias em êxtase com aquele cenário enquanto meditava...

Voltou ao local onde havia visto a Luminosidade.

Deitou-se debaixo de uma árvore frondosa. Quantas flores!

Como é possível: toda esta beleza ser fruto de uma única semente?!

Ficou de pé. Abraçou o tronco. Agradeceu a árvore!

Sinto uma Paz imensa quando estou aqui!

Semente! É preciso SER MENTE!

Refletiu. Lembrou-se das pessoas nas cidades...

Quanto concreto, poluição, ruídos, trânsito! Asfalto fervente! Calor! Quanto calor! Quanta aridez! Quando chove, a água derruba as casas... Não estaria faltando planejamento urbano-ecológico? Qual seria a proporção ideal de verde para cada ser vivo? Será que cada pessoa poderia ser responsável ao menos por uma árvore?

A noite veio chegando devagarinho, devagarinho...

Beijou algumas árvores e várias sementes caíram em sua cabeça. Ela as recolheu e foi para casa.

No outro dia, foi à cidade, pensando:

O que é ser Pipoca? O que será isto?

Vou perguntar às pessoas. Saiu pela cidade.

Ah! Isto é palhaçada! Onde já se viu uma pergunta destas?

Os transeuntes se afastavam sorrindo, abanando a cabeça.

Num domingo, enquanto fazia a sesta, recostada sob uma daquelas árvores, lembrou-se do sorriso das pessoas, das suas reações.

Ser pipoca? Isto é uma palhaçada! Então é isto!? Já que, falando, consigo fazer as pessoas sorrirem, a partir de hoje serei “A Palhaça Pipoca”!

Preparou então o circo. Afinal, as pessoas nem sabem o motivo de se comer pipoca no cinema! Que circo diferente! Pipoca contou várias histórias! Dentre elas, a história da Mãe do Ouro. No final de todas as apresentações, doou sementes para a criançada e explicou:

São sementes mágicas! Plante-as! Regue-as, com carinho todos os dias! Quando estiverem crescidinhas, quase do seu tamanho, você deverá doá-las.

Se são mágicas, qual o motivo para doá-las?

Aí está a magia... Faça e verá!

Eni assistia atentamente ao espetáculo. Plantou. Cuidou. Mais tarde, doou. Recebeu também outra plantinha. Um dia, precisou mudar de cidade para trabalhar. Comprou um apartamento na região do Prado, em Belo Horizonte. Fixou a arvorezinha defronte à sua casa. Cuidava dela todos os dias, apesar da correria diária.

                A árvore cresceu.

                Eni acostumou-se à aridez da cidade. Já não olhava mais nos olhos das outras pessoas enquanto falava, andava cabisbaixa, mal cumprimentava os outros. Respondia não mais por educação e, sim, por obrigação. Um dia, estava estafada. Seu olhar perdeu o viço, ficou sem brilho. Começou a folhear um livro.

 De repente, um vento assanhou as cortinas. Ela chegou até a janela para sentir melhor o frescor da brisa. Ficou perplexa! Começou a rir! A árvore estava coberta de flores...

 Num piscar de olhos, voltou à infância. Lembrou-se da história da Mãe do Ouro!

Hummmmm! Árvores de flores amarelas...

Lembrou-se de sua melhor amiga, aquela que um dia havia lhe presenteado com aquela plantinha, nascida das sementes que Pipoca espalhara... Procurou a amiga. Há muito não se comunicavam! Marcaram um encontro. Compartilharam lembranças, sonhos, experiências... Fizeram projetos! Relembraram a infância e as histórias... 

Enquanto olhavam para a reluzente copa dourada da árvore, quase desmaiaram... de tanto rir! Não viam sorvetes. Enxergaram cabeças e chapéus de palhaças. Aos milhares. E milhares... E sorriram!  

Seus corações encheram-se de alegria!

Sentiram uma Paz imensa! 

Suas faces ficaram iluminadas!

Uma sombra fresca aplacou o calor do asfalto. Recolheram as sementes para repassá-las aos amigos, tal qual elas receberam um dia.

Amizade!

Mãe do Ouro... 

Quanta sabedoria!  Mãe de todas as riquezas! 

Ser mãe também significa amar... E amar é cuidar! 

– Sim! Cuidar do meio ambiente é expressão de gratidão e forma de declarar o nosso amor por tudo e por todos!

Descobriram a magia!

Afinal de contas, onde estará Pipoca? Perguntam-se.

– Não importa! Vamos ajudar Pipoca a espalhar a Boa Nova!

Dizem que ela já percorreu o mundo várias vezes, doando seu carinho, seu cuidado e atenção, com seu jeitinho mineiro de ser, contando seus “causos”, propagando a história da Mãe do Ouro, permitindo que as pessoas possam fazer ressignificações das histórias e de suas vidas... Levou estas e outras sementes: por causa delas, amigas e amigos reencontraram-se e colhem juntos até morangos no deserto!

Uma semeadora incansável! Semeou. Semeou.  E semeou.

Dizem que ainda trabalha incessante para alcançar seu objetivo: um mundo onde todos são felizes!

 Para muitos, Pipoca tornou-se símbolo de diversão e de alegria: nas cidades, vê-se grande quantidade de verde, de parques... E flores de várias tonalidades! Sombra! Frescor! Inclusive, nas avenidas das grandes cidades!

E agora, em quase todas as ruas, árvores enfeitadas com flores-palhaças!

Onde já se viu?  

Dizem que pipoca ainda anda por aí e continua fazendo suas perguntas:

E você? Qual é o seu grande objetivo? Que tipo de sementes tem distribuído? Como está a sua cidade?

Por onde Pipoca andou deixou não somente a palavra, mas também a ação... Em cada canto, o mundo está ficando cada vez mais fraterno, mais amigo!

O mundo está cada vez mais verde! 

Ou será que Pipoca ainda não passou por aí?

 Ou vocês nunca leram ou ouviram a história “Pipoca e as sementes mágicas”, escrita há mais de uma década, na Primavera de 2004?

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Imagem: https://www.iconspng.com/image/32075/ip-amarelo



30 comentários:

  1. Conceição Cruz nos presenteando com seus textos interessantes e que trazem grandes ensinamentos. Pude lê-lo para meu filho de 9 anos antes dele dormir. Ele adorou e nos fez lembrar da maravilha que é o ipêamarelo nessa época. Outro ensinamento é a reflexão do que temos semeado no nosso dia a dia.

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  2. Conceição Cruz nos presenteando com seus textos interessantes e que trazem grandes ensinamentos. Pude lê-lo para meu filho de 9 anos antes dele dormir. Ele adorou e nos fez lembrar da maravilha que é o ipêamarelo nessa época. Outro ensinamento é a reflexão do que temos semeado no nosso dia a dia.

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  3. Que linda história! Fico encantada com sua imaginação em criar histórias. Mês de setembro é o mês da cor amarela, dourada e dos Ipês amarelos, que enfeitam nossas matas.
    Abraços 🤗

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  4. Que linda história! Fico encantada com sua imaginação em criar histórias. Mês de setembro é o mês da cor amarela, dourada e dos Ipês amarelos, que enfeitam nossas matas.
    Abraços 🤗

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  5. Histórias: através delas viajamos

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  6. Nossa Conceição!!!!
    Que alegria começar o dia lendo uma História tão especial!!!!
    Confesso que simplesmente entreguei as minhas mãos e me deixei conduzir pela amiga "Pipoca"!!!!!!
    Agradecida.

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  7. Adorei!
    Que história linda!
    Que eu seja semente e possa colorir o mundo!

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  8. Li a história o tempo todo com um sorriso no rosto, ela retrata a inocência de nossa infância,nos retorna as nossas raízes, as nossas crenças infantis, ao mesmo tempo nos trás aos dias de hoje, nossas conquistas de afetos e sabedorias que passamos de geração a geração, parabéns pela sutileza com que nos faz refletir

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  9. Ei, Conceição!! Amei isso: "Quando chove, a água derruba as casas... Não estaria faltando planejamento urbano-ecológico?" Pois é... não dá pra ficar culpando as árvores pelo mal feito das pessoas, né? Pior ainda é cortá-las, achando que isso é solução. Gostei das perguntas inteligentes da Pipoca e da chamada à responsabilidade que ela faz a cada um de nós. Beijos

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  10. Conceição: lindão este seu texto. Parabéns!

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  11. Semear, semear, semear e SER mente!

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  12. Belíssimo trabalho! Como sempre a querida amiga Conceição, conseguiu trazer lembranças de nossa infância, com suas estórias criativa e alegres.
    Parabéns amiga. Continue sempre assim, nos proporcionando sempre essas experiências.

    Abraços.

    Paulo Mariano

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  13. Mariade Lourdes Nogueira Paulino14 de setembro de 2020 às 15:33

    Amei o texto, Conceição!
    E como o assunto, cuidar do meio ambiente, é atual!

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  14. Lindo. Seus textos e poesias sempre entretendo e instruindo. Parabéns!

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  15. Adorei o texto ! Bem inspirada a escritora, sendo que história pode ser levada de inspiração para uso nas políticas das Cidades.

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  16. Imaginem quanto verde a cidade ganhará com a leitura deste e imitação de "Pipoca"?
    Que estas ações-sementes sejam, em breve, árvores nas políticas públicas.

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  17. Lindo texto, Parabéns Conceição!

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  18. Com tanta queimada e crimes ambientais, tem gente colocando sementes em balões para serem semeadas pelos ventos!

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  19. Parabéns por SER mente,na vida de cada leitor e nos proporcionar esta leitura deliciosa. Abraços , Sucesso sempre.

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  20. Parabéns enquanto estava lendo fiquei lembrando dos meus alunos brincando de jogar flores de ipê rosa uns nus outros.

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  21. Parabéns Conceição!
    A cada história que compartilha é como uma semente plantada na mente de quem lê. Além de proporcionar boa leitura q nos trás lembranças da infância.

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  22. Parabéns Conceição!
    A cada história que compartilha é como uma semente plantada na mente de quem lê. Além de proporcionar boa leitura q nos trás lembranças da infância. Mônica Martins

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  23. Muita linda a mensagem que a Escritora Conceição Cruz passa para nós e gerações futuras com o tema das Pipocas e as Sementes mágicas. Parabéns !

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  24. "Quem planta tâmaras não colhe tâmaras!" Mas gratidão, admiração e respeito, Conceição. Falo assim pelo meu pai, que é como a Pipoca, onde vai distribui mudas e sementes e, interessante, as pessoas lembram e falam: as rosas estão lindas, o abacate já está produzindo, a manga já deu esse ano, o ipê é rosa, amarelo, roxo ou branco, tenho "aquela muda" até hoje, Sr. Mário, plantei aquelas sementes que o senhor me deu, já colhi, então, quem dá uma planta ou semente nunca é esquecido, é lembrado com muito carinho e admiração. Sejamos como ele e a Pipoca. Sejamos ser Mente e sementes do amanhã. Parabéns pelo lindo texto e incentivo à cultura e cuidados com o ambiente em que vivemos. Produza mais textos para apreciarmos, ok!??? Beijos!

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  25. Que história linda. O mundo precisa de mais pessoas como a Pipoca! ��������

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  26. Que sejamos todos “pipocas”, pulando por aí, impulsionadas pelo fogo do amor e da vontade de construir algo bom.
    Fazer multiplicar o que houver de melhor em nós, espalhando boas sementes e florindo todos os caminhos.
    Como esse texto tão belo e bem escrito floriu minha imaginação ao lê-lo e plantou coisas boas em mim. Parabéns.

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  27. Liindooo. Agradeça a Deus por esse dom maravilhoso. 👏👏👏👏👏👏

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