Carmélia Cândida começou sua
carreira artística como contadora de histórias. Depois foi para o teatro e o
cinema, e nessas áreas artísticas desenvolve trabalhos como atriz, autora e
roteirista. Publicou dois livros de forma independente: “O Azul dos olhos dela”
(2021) e o infantojuvenil “A fuga da sereia” (2021), este último ilustrado por
Michel Salazar. Essa artista vem conquistando seu lugar no panteão da arte
pará-minense a cada trabalho lançado. Leia a entrevista realizada
exclusivamente para esta coluna.
JRP
– Comente esta frase: “Quase todos os brasileiros sabem escrever, mas
pouquíssimos realmente escrevem”.
Carmélia - Saber escrever ou ler, no
sentido de ser alfabetizado, guarda uma longa distância do escrever bem e do
ler com proficiência, ou seja, interpretando, atribuindo sentidos ao que se lê.
Escrever não é uma tarefa fácil, e é uma dificuldade para muitas pessoas. O Brasil
não é um país de leitores, a educação –
no nosso contexto histórico – nunca foi prioridade
para os governantes, a arte e a cultura não são valorizadas. Nesse cenário, não poderíamos esperar que a
maioria das pessoas que “sabem” escrever realmente escrevam.
JRP - Como se deu sua descoberta no
campo da escrita?
Carmélia - Meu gosto pelas letras e
pelo artístico foi despertado já nos meus primeiros anos. E entendo que o que
veio depois, na minha vida artística, tem a ver com esse início. Algumas coisas
como consequências de outras. Nos tempos de colégio, vez ou outra, eu flertava
com a escrita, e isso foi me acompanhando. Mas demorou até que eu passasse a
escrever com mais consistência. De uns onze anos pra cá, é que comecei a me
dedicar mais à escrita, da forma como me é possível. Eu entendo que tornar-se
escritor – assim como ator, músico ou outro artista – é um processo, uma construção que demanda
tempo, experiências etc. Eu só sei que eu escrevo, quando o texto vem ou quando
eu desejo buscá-lo. E isso não acontece sempre. De tempos em tempos, eu me
sinto aberta à escrita, e escrevo muito, minha escrita flui como água jorrando
de uma fonte. É maravilhoso! Mas, em outros tempos, algo em mim se fecha, e não
consigo escrever nada. Então eu estou me descobrindo ainda e espero estar
sempre. Enquanto eu estiver nessa construção, estarei experimentando,
aprendendo, me aperfeiçoando e, o melhor, surpreendendo a mim mesma.
JRP
- “A fuga da sereia” é seu segundo livro publicado, mas é o primeiro dedicado
ao público infantojuvenil. Do que se trata a história? E como seu público
recebeu este trabalho?
Carmélia - A história se desenvolve
em torno do sumiço de uma sereia e começa no ponto em que nasce o rumor de que
ela havia fugido. E não tinha fugido sozinha! Levara com ela o Boto Rosa. O
rumor vai crescendo, se espalha, e tudo e todos
– mar, praia, homens, peixes, animais da água e da areia – sofrem com a ausência dela. Nesse cenário, a
gaivota, ao voltar de viagem e ficar sabendo do ocorrido, se mostra desconfiada
e coloca todos em alerta. Começam, então, a investigar melhor a história. O que
será revelado eu não vou poder contar, pois eu quero que as pessoas descubram
com os personagens, lendo o livro e as belas ilustrações, mas posso dizer que o
leitor irá se deparar com uma narrativa marcada por amizade, perdão, redenção,
amadurecimento, entre outros temas.
O livro tem sido muito bem recebido
pelo público. É gratificante, pois, quando a gente faz um trabalho, só vamos
saber a dimensão dele quando ele chega às
pessoas, e eu fiquei até surpresa positivamente com o interesse e carinho delas
e com os retornos recebidos.
JRP
– Publicar livro no Brasil é fácil? E
como você foi agrupando os profissionais necessários para dar vida a este
projeto?
Carmélia - Para publicar de forma
independente, ficou mais fácil em relação a anos atrás, considerando que hoje
quase tudo pode ser acessado ou resolvido pela Internet. Ainda assim, é
difícil, pois os custos da publicação são altos e vender livros não é tarefa
simples. Publicar com contrato com editora, com os custos por conta dela,
acredito que, no Brasil, é para poucos.
Por motivos diversos, passaram-se
dezoito antos entre o tempo que escrevi o texto e o tempo em que decidi que
faria a publicação de forma independente. Isto se deu em 2019 e, após a
primeira tentativa de preparar a edição, foram mais de dois anos até o que
livro saísse da gráfica. No caso, minha maior dificuldade foi encontrar um
ilustrador. Passei por tentativas frustrantes e desanimadoras. Quando encontrei
o Michel Salazar, tudo fluiu, ele também
fez capa, projeto gráfico/diagramação, e isso simplificou muito o processo, pois ficou
faltando somente o serviço da gráfica.
JRP
– O que podemos esperar da sua produção
artística em 2022?
Carmélia – “Mulheres santas também
são inquietas” é
um livro de poemas sensuais que finalizei em 2020 e será lançado provavelmente
em março; devo lançar um infantil no segundo semestre e outro no fim do ano,
com uma história de Natal (era para ter lançado este ano, mas não ficaria
pronto a tempo).
No
teatro, estou com o projeto de montagem de um espetáculo sobre violência contra
a mulher que quero muito concretizar, é um texto cuja pesquisa e escrita comecei a desenvolver no fim de
2018.
Começo a trabalhar, no momento, na construção
de um roteiro, com o José Roberto Pereira, de uma série que deve ser gravada já
no início do ano, sob a direção do José e do Guto Aeraphe.
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Entrevista realizada por José Roberto Pereira, publicada originalmente no Jornal Diário
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