sábado, 19 de dezembro de 2020

Um VIVA aos laços

Maria de Fátima Moreira Peres

Cadeira n.º 15




Adoro laços. Laços de amor, de amizade, de carinho, de Cora e cores. Eles sempre me chamam a atenção. Adoro também, fotos antigas em preto e branco. Nunca sei o porquê chamam de preto e branco, pois de branco, nunca se vê nada. São sempre amareladas pelo tempo, pelas memórias ali escondidas.

Certa vez me encantei com o laço de fita nos cabelos de Conceição. A foto da mocinha bem vestida, com vestido de cintura baixa e sapato boneca, ao lado das outras meninas da família. Seu olhar era doce, tímido, inocente. Conceição não sabia, até então, o rumo que a vida lhe proporcionaria.

Casou-se muito jovem. Teve doze filhos, um após o outro, cinco homens e sete mulheres. Não foi permitido à Conceição desfrutar dos prazeres da juventude. Ela apenas cuidou das crianças, dos afazeres domésticos e de suas obrigações como esposa. Nem sonhar Conceição podia, pois se o fizesse, seria uma inconsequente.

A primogênita de Conceição se chamava Januária. Aos três anos de idade posou para uma foto com um laço de fita na cabeça. Ele também me chamou a atenção, pelo tamanho e forma. Seu laço se parecia com o de Conceição, assim como seus cabelos encaracolados, seu olhar doce, tímido e inocente. Como o de Conceição, o destino de Januária não foi nada fácil. Jane, como era conhecida, só pariu três filhos, uma menina e dois meninos. Porém, os tempos eram outros e a vida com poucos recursos financeiros deixou suas indeléveis marcas. 

A primogênita de Jane se chamava Márcia. Aos dois anos de idade, Márcia posou para uma foto com um laço de fita no cabelo. Também tinha os cabelos encaracolados, era tímida, mas seu olhar expressava a insatisfação de estar fazendo algo que não queria. Márcia só queria brincar como uma criança, correr de pés descalços pelo quintal. Não era afeita aos modelitos fotográficos que se amarelavam pelo tempo.

Márcia se casou e, também, deu a luz a três filhos, dois meninos e uma menina. O destino de Márcia não tem sido nada fácil. Ela trabalha muito e o dinheiro que ganha é sempre o suficiente para chegar ao último dia do mês e, às vezes, nem isso. Juliana é da segunda gestação de Márcia. Com seus cabelos lisos como de uma japonesinha, também posou para fotos com um laço de fita. Ela não é a primogênita, não se casou, mas teve uma filha, Estela. A vida de Juliana é um pouco melhor do que de Márcia.

Certo dia, olhando um álbum de fotos vi que Estela tinha um grande laço de fita rosa na cabeça. Como aquele de Conceição, de Jane, de Márcia e de Juliana. Ela é a primogênita de Juliana e seus cabelos encaracolados lembram Conceição, Jane e Márcia. Todas têm o mesmo olhar nas fotos amareladas pelo tempo ou nas coloridas. Seu destino como mulher se descortina em tons mais alegres, suaves, porém definidas, ainda que o tempo passe tão rápido. Estela pode sonhar com o que quiser.

Mas não importa a cor, pois o laço que une as cinco gerações é uma marca que nunca se desfaz. A sua força está no sentir. Todas elas se comunicam sem estar perto umas das outras transmitindo seus sentimentos de dor, de alegria e satisfação. Alguns dizem que é sexto sentido, mas sabem que é mais do que isso. Outros, que são bruxas. Elas riem. – É algo que se herda, diz Márcia. Mas seja lá o que for isso, sempre terão um laço de fita no cabelo. E um VIVA aos laços, neste mundo tão cheio de nós!

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Imagem: https://www.gratispng.com/png-s2cgr3/





Um comentário:

  1. "Mundo tão cheio de NÓS": que nossa habilidade de SENTIR, estreite os LAÇOS DE AMIZADE e de mudança para transformar o mundo das "Conceições!"

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