Com o ar denso e úmido, o sol cede lugar aos aguaceiros. Meu dezembro é dos fins de tarde tempestuosos, aos quais o calor do dia quase não cede. O frio está só nas representações exógenas de neve polar e de um velho embrulhado em roupa vermelha, quente como a visão intempestiva de uma lareira acesa. Minha infância vivia este mês com entusiasmo, um período de intensa ebulição. De súbito, toda gente se põe a correr pra todo lado, as ruas se enchem, ficam mais iluminadas e explode o consumo. Essa detonação aniquila qualquer pretensão de tranquilidade, a culminar com o som dos foguetórios da virada do calendário. É o colapso barulhento do ano envelhecido e a inauguração estrondosa de um novo, promissor, onde agitamos nossos corpos numa overdose festiva. Também um tempo que evoca esquecidas solidariedades, por um espírito que nos comove, como se o mês, na lembrança cristã, nos despertasse um enorme desejo de sermos um, em atenção e presença. Com tudo isso, nos traz, em paradoxo, a consciência de tudo o que é abundante e de tudo o que nos falta. Assim, ele se faz alegre e triste em simultâneo. Meu dezembro tem gosto de sorvete de limão.
