Em uma paragem distante, bem no deserto - entre a África e a Ásia - havia um poço de águas amargas[1]...
Uma gotinha estava lá há séculos: ela não sabia o motivo pelo qual ela e seu grupo de amigos foram parar bem ali, agarrados às pedras, cheios de amargura, no mais profundo daquele lugar.
A todo custo, evitavam a Luz[2], egoisticamente recobertos por uma carapaça de minerais, mantendo o sabor amargo e desagradável ao paladar humano.
Por vezes, ouvia dizer que as águas mais leves, mais rentes à superfície - aquelas mais próximas à Luz - elevavam-se com maior facilidade...
Da sua posição, não percebia claridade alguma e mais e mais fechava-se naquele local de trevas. Acostumada a viver ali, presa – vez por outra - ficava absorta, meditando sobre a natureza da realidade e as perspectivas de passado e de futuro...
No seu interior, ela sabia de sua importância para a vida...
Porém, chamava-lhe a atenção o papel das águas destruidoras, como ocorrera no dilúvio...
Havia uma contradição ferrenha entre aquele instante - de estar no fundo, ensimesmada em seu egoísmo, pois ninguém tiraria um pingo dali para beber - e de sua essência renovadora como fonte de vida...
Nada de novo acontecia: o líquido não se renovava. Vivia em verdadeira estagnação...
Não sabemos “por qual carga d’água”, nasceu em seu âmago o desejo de transformar-se, de cumprir o seu verdadeiro papel, de ser fonte de vidas e de Vida!
Diante de tanta mesmice e de falta de novidades, caiu em um sono profundo... Sonhou com o Messias e fatos futuros ligados às águas: em sonho, teve a visão do Batismo d’Ele no Rio Jordão e da cura do cego, juntando argila e água, devolvendo-lhe a visão. Vislumbrou também quando Ele caminhou sobre as águas, acalmou a tempestade... A pesca milagrosa além de tantos outros milagres... Milagres. Muitos milagres!
Numa noite, voltou a sonhar com aquele Ser de tamanho imensurável, fazendo vibrar todos os seus átomos... Um mundo de Luz e Paz!
As outras partículas à sua volta não admitiam a possibilidade de um mundo cheio de claridade...
Sempre que ela sonhava com o Mestre, mais e mais crescia o seu desejo de se libertar.
Intimamente, na busca por respostas, compreendeu que era importante vivenciar os diferentes ciclos de sua evolução...
Mas como mudar? Mudar-se? Como sair daquele estado?
Por meio da interpretação de seus sonhos, reconheceu-se e também vislumbrou outras possibilidades... Porém, não compreendia a voz do Grande Silêncio e desiludiu-se... Ao desiludir-se, tornou-se mais leve, leve, leve...
Certo dia, despertou sentindo-se cheia de docilidade, a qual repercutia em todo o ambiente. Algo diferente havia acontecido: aquele mundinho foi tocado por um elemento de um outro reino - por uma árvore[3] - a qual ingressou nas entranhas daquele abismo, trazendo-lhe a graça de tornar tudo mais dócil e mais doce...
Ela nem bem havia sentido direito aquele novo estado, buscando entender a importância da conexão íntima e expansão da consciência, já estava lá no alto, na superfície: evaporou-se formando nuvens, iniciando um ciclo de mansidão de subir aos Céus e de descer à Terra...
Nessas idas e vindas, lapidou-se, deliciou-se em servir, em ser útil a todos os Reinos, fazendo disso a Razão de sua existência, aumentando ainda mais o seu entusiasmo a caminho da iluminação.
Em uma bela noite, observou no Céu um sereno clarão que irradiava por toda a Terra...
Lembrou-se da época das sombras: percebeu um friozinho em seu ventre...
De forma compulsiva, começou a chorar: gigantesca era a sua emoção...
Naquela Noite Feliz, a gotinha e suas lágrimas, quando perceberam, já haviam descido em um suave sereno e já estavam em uma bacia de argila, lá na gruta de Belém entre os animais: era Natal!
Embebidas em um tecido suave, banharam com ternura o corpinho daquela Criança que acabara de nascer...
Naquele momento, ela sentiu uma intensa purificação, alinhada à uma vontade férrea de seguir as mensagens recebidas em seus sonhos, comprometendo-se a cumprir o ideal que trazia dentro de seu ser[i].
No mundo atual, aquela gotinha - despida de todo e qualquer egoísmo - vibrando amor - trabalha no meio dos homens, contribuindo para o redespertar da alma e do coração deles, ajudando a fomentar a ideia de um Grande Propósito: ser fonte de Vida e de vidas para a família, para a sociedade, para o planeta e para todo o Universo...
[1] Êxodo 15:23 - Então chegaram a Mara, mas não puderam beber das águas²³ de lá porque eram amargas. Esta é a razão porque o lugar chama-se Mara.
[2] Acredita-se que ela esteve presente no momento da origem, quando “o Espírito pairava sobre as águas”, antes mesmo da criação da Luz, imersa em profundas trevas...
[3] Imagine uma multidão de israelitas caminhando por 3 dias no deserto e ao chegar em um oásis, encontrar água salobra, amarga? Moisés, à frente, ouviu as reclamações, pediu instrução divina e foi orientado a jogar uma árvore na água. Ele, de forma dócil, ou seja, submissa ao plano divino, jogou o lenho e a água tornou-se doce. Para saber mais, veja na Bíblia Êxodo 15:23-25.
[i] Será que, desde aqueles dias, ela passou a testemunhar os ensinamentos Crísticos, participando de eventos marcantes? A chamada de seus discípulos, a noite de lava pés, as lições às margens do mar da Galileia e tantos outros fatos?
Quem sabe, no último instante, quando do peito do Messias brotaram sangue e água, tocado por uma lança - ela estava dentro dele e saiu?
E, dias após, vivificou-se no Mestre Ressuscitado, quando Ele comeu peixe assado - animal que vive na água - com seus discípulos?
Sabemos que o Mestre, verdadeiramente, ressuscitou.
E aquela gotinha?
Qual homem sabe dizer sobre o paradeiro dela, agora, cumprindo os seus ciclos entre nós?
Talvez aquele que, espiritualizado e ansioso por purificação, busque a Fonte de Água de Vida Eterna?
Seguramente, esse homem plenificado, essa nova criatura - junto “Àquele que Vive” - a encontrará.
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Imagem: criada por IA generativa
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Amados leitores,
Aproveito o momento para agradecer a cada um o tempo dedicado à leitura.
Agradeço-lhes também as mensagens e as críticas amigas emitidas durante a nossa jornada, especialmente, no ano de 2025, que muito contribuíram para as nossas reflexões e alegria.
Desejo-lhes um Santo Natal e um 2026 repleto de bênçãos.
Forte e fraternal abraço,
Conceição Cruz.


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