José Roberto Pereira
Cadeira n.º 12
Novamente usaram nosso
ofício de trabalhadores da arte para garantir vantagens, para aparecerem como
destaque em mídia fácil. Atacam-nos, covardemente. Andam nos rebaixando a algo desnecessário ou
nos comparando a uma sanguessuga que nunca está saciada.
Em outros tempos, já chamaram
nosso trabalho de alimento da alma, porém, atualmente, saciados, vomitam onde
tantas vezes se alimentaram. Afirmavam também que nosso trabalho humanizava. Mandaram-nos
para áreas sociais aonde o poder governamental não conseguia chegar. Após o
trabalho iniciado, a casa arrumada, o povo com a voz levantada, instruído pelas
ações culturais às quais foram apresentados, aqueles que estavam no poder (ou
ainda estão), vieram e silenciaram povo e artista. Cortaram quaisquer tipos de
verbas ou iniciativas a fim de impedir que as pessoas da área assistida continuassem
cantando suas desgraças ou alimentando seus sonhos. E continuam usando nosso
trabalho para chegarem ao poder, pronunciando em palanques que a arte e cultura
são essenciais à formação de qualquer indivíduo, mas depois ignoram nossos
produtos. Atacam-nos pelas costas porque, muitas vezes, são incapazes de
dialogar frente a frente. Fecharam algumas de nossas casas e engavetaram nossas
pastas.
Já fomos chamados de
brisa fresca que acalenta as mazelas humanas.
Um bom espetáculo, um bom livro, um bom filme – entre outras produções
dos trabalhadores da arte – são capazes de inaugurar sentimentos, sensações e
renovar a vida. Em momentos de stress,
de patologia, de angústia, de cansaço, usam nosso trabalho, usufruem de toda a
cadeia produtiva artística para se recuperarem, mas depois blasfemam que não
precisam de artista. De outros trabalhadores, sim; mas, do artista, não.
Ignoram que uma simples roupa, um sapato e alguns assessórios indispensáveis ao
nosso dia-a-dia estão na área de atuação dos trabalhadores da arte. A
ignorância torna as pessoas cegas e canalhas.
Aqueles que usaram do nosso
suor para conseguir a cadeira do poder andam tentando nos subtrair leis que nos
concederam direitos. Cortam nossas míseras verbas conquistadas ao longo das
décadas de articulações entre poder público e trabalhadores da arte, criando
ambientes hostis e nos colocando uns contra os outros. Até de malandro e
vagabundo nos chamam. O que nós conquistamos, porém, ninguém nos tira. Estaremos
sempre um passo à frente, nunca retrocederemos aos porões da estupidez
governamental de direita ou de esquerda.
Até o momento, fomos
brisa fresca, favorável, alvo fácil para tudo aquilo que nos é jogado e
blasfemado. Mas, se quisermos, nós, trabalhadores da arte, poderemos nos
transformar em tempestade tropical, tornado, furação destruidor e impiedoso. E poderão
ver do que é capaz “um vento fresco”. Um grupo se agiganta quando quer. Aí tudo
pode mudar. O que antes refrescava poderá esquentar. Podemos percorrer
distâncias, varrendo um país inteiro, usando as mais convincentes palavras, sem
o apelo da persuasão ou da mentira em mídia sem credibilidade – apenas dizendo
a verdade. Como furação, poderemos destruir tudo. Colocar pedra sobre pedra e
recomeçar. Mas, como somos arte, cultura viva e história, não podemos ignorar a
ética, o bom senso e eliminar nossos inimigos. Porque somos resistência, como
sempre fomos ao longo da formação das sociedades nas ilhas e continentes. Somos
água, sempre nos movendo e nos adaptando às intempéries. O tempo, os homens, os
ideias passam ou mudam. A arte e seus trabalhadores agregam, se refazem, se
revezam, se reconstroem, tornam-se história. Estamos no tempo de sermos
furação, porém com a delicadeza de permanecermos brisa.
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