Convivi pouco com o Dirceu Mendonça, muito menos do que gostaria. Mas tenho algumas lembranças.
Hoje, ocorreu-me uma de quando nos reunimos em sua casa, na rua Prefeito Carmério Moreira dos Santos. Era uma reunião da Associação de Escritores de Pará de Minas. Não me lembro por que motivo estávamos lá, sentados na mureta do alpendre da casa do Dirceu. Acho que a Associação tinha dificuldades de achar um local, a cada mês, pra se reunir. Enfim, estávamos lá: Dirceu, eu, Valmir e creio que o Pedro e o Márcio também.
Duas coisas me marcaram muito neste dia. A primeira foi Valmir dizer que o Dirceu era tão zeloso da Associação que já tinha feito até reunião dele com ele mesmo (Dirceu e Uecrid!). Achei muita graça nisso, mas depois entendi que, para o Dirceu, compromisso é compromisso. Chegava o dia, era certo ele comparecer, independentemente de quem fosse ou deixasse de ir às reuniões. Esse era um traço marcante da personalidade do Dirceu.
Mas foi naquele dia também que o Dirceu me falou de sua atuação na pastoral carcerária, uma ação da Igreja Católica Romana vinculada à CNBB. A pastoral carcerária “tem como objetivo a evangelização das pessoas privadas de liberdade, bem como zelar pelos direitos humanos e pela dignidade humana no sistema prisional”. E era assim que o Dirceu atuava, prestando serviço advocatício gratuito aos encarcerados, para garantir seus direitos humanos de pessoas dotadas de dignidade. De fato, acho este trabalho das coisas mais lindas e mais difíceis de se fazer.
O texto do Evangelho de Mateus diz assim: “Pois eu estava com fome, e me destes de comer; estava com sede, e me destes de beber; eu era forasteiro e me recebestes em casa; estava nu, e me vestistes; doente, e cuidastes de mim; na prisão, e viestes até mim”. (Mt 25, 35-36 / Bíblia CNBB). Quem é capaz de encarnar essa palavra forte? Dar de comer a quem tem fome e de beber a quem tem sede é importante sim. São gestos básicos, primordiais. Mas acho também que são os mais possíveis a qualquer um de nós, assim como vestir quem está nu. De outra parte, dar abrigo ao forasteiro, cuidar do doente e ir até os encarcerados na prisão, para prestar-lhes auxílio, quem se habilita? Muito poucos. E não é mesmo pra todos nós. Naquela hora, o Dirceu, que já era grande em estatura, tornou-se o grande Dirceu para mim.
Bem mais tarde, ouvi falar da Apac - Associação de Proteção e Assistência aos Condenados, quando já não tínhamos o Dirceu conosco. Mais tarde ainda, fui realmente saber o que era a Apac: uma ONG fundada em 1972 por voluntários cristãos, como o Dr. Mário Ottoboni, e me encantei. Morador de São José dos Campos, Dr. Mário começou atuando na pastoral carcerária, exatamente como o Dirceu fazia na nossa Terrinha, e criou metodologia Apac, totalmente nova e restauradora.
A partir daquele dia junto do Dirceu, meu olhar para a população carcerária mudou. Passei a pesquisar e refletir muito sobre o nosso sistema penal e prisional, que nem sempre é justo, é seletivo, punitivo, encarcera muito e não restaura.
Então, querido Dirceu, receba o meu carinho e a minha saudade, porque sei que você vive sim, de um outro jeito. Ah, e mando também um abraço para o Uecrid, que certamente, está juntinho com você.
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